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sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Afinal, por que não se decreta estado de calamidade pública em Crateús?

Diante da situação dramática vivenciada pela população crateuense, às voltas com a falta d'água, é surpreendente que ainda não se tenha decretado calamidade pública no município.   Não bastassem os dois anos de inação por parte do poder público, em que muito pouco ou quase nada foi feito para evitar o colapso no abastecimento, agora, os governos se negam a reconhecer o desastre ao qual o município foi conduzido.

Crateús não tem água.  O  Carnaubal, reservatório que abastece o município, secou e o sistema de abastecimento entrou em colapso, depois de dois anos de racionamento.  Nos bairros centrais da cidade ainda é possível, aqui e acolá, ver a torneira regurgitar um líquido turvo, que a Cagece alega ser água potável, extraído forçosamente de poços perfurados no leito seco do açude. Como aprendemos na escola, para que seja considerada potável, a água deve apresentar certas características, tais como ser incolor, inodora e insípida.  Em outras palavras: sem cor, sem cheiro e sem gosto. Assim, é realmente difícil acreditar que aquela água barrenta, com cheiro forte e gosto de lama que ainda chega em algumas poucas residências de Crateús seja potável. Não serve nem para cozer os alimentos!

Açude Carnaubal, em Crateús
A verdade inconveniente para os governantes é que toda a população urbana de Crateús precisa comprar água.  Quem tem onde armazenar grandes volumes e, principalmente, dinheiro pode contratar os serviços de carros-pipa e receber comodamente água de procedência duvidosa em sua casa. Muitos, por outro lado, têm tido de suportar o desgaste de madrugar e a aceitar a humilhação de aguardar horas nas filas de caixas d’água que funcionam como chafarizes, recentemente instaladas em alguns dos bairros mais carentes. A antiga cena de pessoas carregando latas d’água na cabeça agora é rotina em muitos bairros.

Em dois bairros, foram instalados dessalinizadores. Nestes locais, a população também enfrenta grandes filas e paga R$ 0,50 para receber 40 litros de água, o que corresponde a pouco mais de um terço do volume considerado mínimo pela Organização das Nações Unidas-ONU para atender as necessidades básicas diárias de uma pessoa.

Diante da escassez, a população passou a estocar água, cuja má qualidade também fez aumentar os casos de diarreia. O armazenamento do líquido ainda traz a preocupação com a elevação do número de casos de dengue e a ocorrência de febre chikungunya no município.

  População faz fila para comprar água dessalinizada
As ações de enfrentamento à falta d’água em Crateús, além de insuficientes, só passaram a ser implementadas depois que ficou evidente que a adutora que trará água do açude Araras, situado em Varjota, não ficaria pronta a tempo de evitar o colapso do sistema de abastecimento. Tida como a salvação do município, a adutora tem início de funcionamento previsto para o próximo dia 20, mas o cronograma de execução da obra, que deveria ter sido concluída em dezembro passado, pode atrasar ainda mais. E mesmo com a transferência hídrica o risco de desabastecimento em Crateús deve persistir, pois o Araras está com apenas 8% de sua capacidade e pode secar em menos de um ano.

Pode-se perceber claramente que a situação de Crateús é, sim, de calamidade. Então, por que dourar a pílula? Por que não se decreta estado de calamidade pública no município?

A Instrução Normativa No 01/2012, do Ministério da Integração Nacional, define o que é “estado de calamidade pública”: “situação de alteração intensa e grave das condições de normalidade em um determinado município, estado ou região, decretada em razão de desastre, comprometendo substancialmente sua capacidade de resposta”. Mas o que seria um desastre? De acordo com o Governo Federal: “resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem sobre um cenário vulnerável, causando grave perturbação ao funcionamento de uma comunidade ou sociedade envolvendo extensivas perdas e danos humanos, materiais, econômicos ou ambientais, que excede a sua capacidade de lidar com o problema usando meios próprios”.

Então, de acordo com os critérios adotados pelo Governo Federal, Crateús não vive uma situação de desastre? Crateús não vivencia uma situação de calamidade?

Mas, no caso de Crateús, quem é que decretaria o estado de calamidade? Prefeito ou governador? Bom, ainda de acordo com a Instrução Normativa No 01/2012, tanto o prefeito municipal como o governador poderiam fazê-lo.

Enquanto isso, a população sofre, adoece e empobrece ainda mais, tendo que gastar o pouco que tem para comprar água.
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