Em março do ano passado, o programa Fantástico, da Rede Globo, mostrou como funcionava um esquema para fraudar licitações de saúde pública, feito entre empresas fornecedoras e funcionários do Hospital Pediátrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Após a reportagem, o TCU decidiu realizar auditoria em 24 hospitais universitários distribuídos por 19 estados. Todos os 21 hospitais fiscalizados até agora apresentam irregularidades. Os problemas mais comuns são falta de pessoal, ausência de capacitação para funcionários que lidam com contratações e fraudes com licitações.
Para a auditoria, o TCU adotou como paradigma o modelo estrutural desenvolvido pelo Committe of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission, conhecido como Coso, que delineia as características essenciais de um eficaz sistema de controle interno. Tais características são sintetizadas pela “fixação de objetivos, objetos de controle e meios para o atingimento dos objetivos”.
Na avaliação dos hospitais universitários, considerando que o objeto do controle como a área de licitação e contrato, foram selecionados para verificação os seguintes componentes dos meios para o atendimento dos objetivos: ambiente interno, naquilo que impacta a área de licitações e contratos; e atividades de controle, abrangendo as categorias de objetivos operacionais e de conformidade relacionados aos processos da área avaliada.
Antes de partir para a análise do ambiente interno, o TCU constatou que os 21 hospitais avaliados não possuem auditoria interna própria, sendo que amostras de seus processos de compras são incluídas em trabalhos realizados pela auditoria interna da universidade a que estão ligados.
Ambiente interno
Ao analisar o ambiente interno, que é resultante da interação de vários elementos, como integridade e valores éticos; filosofia da direção e estilo gerencial; estrutura organizacional e de governança; e políticas e práticas de recursos humanos, foram observadas deficiências em todos os hospitais.
Em relação à “integridade e valores éticos”, foi diagnosticado ausência ou fragilidade nas comissões de ética de 19 hospitais. De acordo com o TCU, nesse quesito, há que se definir exatamente a conduta esperada de todos os integrantes da instituição. Assim, códigos de conduta devem ser formalizados e comunicados para toda organização e ações disciplinares devem ser estabelecidas, comunicadas e gerenciadas de forma consistente.
No quesito “políticas e práticas de recursos humanos”, 19 hospitais apresentaram irregularidades. As seguintes ausências foram encontradas: de normativo específico para disciplinar a contratação de comissionados e estagiários; de critérios para seleção de servidores que exercem a função de pregoeiro, de atesto de bens e serviços, e de membro de comissão de licitação; de sistema de avaliação de desempenho de servidores e de treinamento para os servidores responsáveis pelos processos disciplinares.
Além disso, foi constatado que servidores do hospital envolvidos com as atividades de licitações e contratos não estão participando com regularidade de cursos de capacitação e atualização nessas áreas. Há ainda, carência no quantitativo de recursos humanos.
Já na análise da “filosofia da direção e estilo gerencial”, foram encontradas deficiências em 14 hospitais. Além da ausência de procedimento específico para licitações de maior vulto e de planejamento das aquisições a serem realizadas, não há monitoramento das atividades e do desempenho da área suprimentos e aquisições. Nos hospitais também não foi observado controle de custos e gastos, ou a existência de indicadores.
Finalizando a auditoria do controle interno, no quesito “estrutura organizacional e de governança”, 16 hospitais apresentaram irregularidades. As principais são a ausência de gratificação para os servidores que exercem funções de chefia no setor de licitações e contratos e deficiência de normativos que definam competência, atribuições e responsabilidades na área de suprimentos e aquisições.
Falta de clareza quanto à estrutura do hospital e às competências dos seus vários setores, assim como de seus servidores efetivos, comissionados e terceirizados e inadequações na estrutura organizacional da área de suprimentos e aquisições são outras carências.
Atividades de controle
As atividades de controle consistem em políticas e procedimentos adotados e de fato executados, para atuar sobre os riscos, de maneira a contribuir para que os objetivos da organização sejam alcançados dentro dos padrões estabelecidos.
Foram avaliados diversos controles preventivos e detectivos, como formalização de procedimentos, supervisão direta, segregação de funções, controles gerenciais e acompanhamento da atividade, revisões independentes, prevenção de fraudes e conluios, rotatividade de funções, procedimentos de autorização e aprovação e controle de acesso a recursos e registros.
Quanto à “formalização de procedimentos”, foram constatadas irregularidades em 14 hospitais. Os centros médicos não possuem normas ou manuais próprios para a execução das principais atividades envolvidas na realização de licitações. Outros aspectos encontrados foram insuficiência do treinamento conferido para utilização do sistema de controle de estoque e a presença de pessoais extraquadro, sem a qualificação devida, em setores críticos do hospital.
Em relação à “execução de controles legais”, o TCU identificou deficiências em 16 hospitais, entre elas: ausência de estudos técnicos (planos de trabalho) prévios aos projetos básicos; ausência de orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os custos unitários; pesquisa de preços feita de forma irregular; fiscalização/acompanhamento dos contratos insuficientes; ausência de justificativa para a contratação por dispensa ou inexigibilidade de licitação; deficiência na publicidade dada ao edital e falta de designação de fiscal do contrato.
Ainda em relação às atividades de controle, cinco hospitais apresentaram irregularidades nos controles preventivos de fraudes e conluios, oito na rotatividade de funções, três no controle de acesso a recursos e registros, cinco na segregação de funções e seis na comunicação das responsabilidades.
Confira a listas dos hospitais já fiscalizados:
Alagoas
Hospital Universitário Professor Alberto Antunes (HUPAA), Universidade Federal de Alagoas (Ufal)
Amazonas
Hospital Universitário Getúlio Vargas, vinculado à Fundação Universidade do Amazonas (UFAM)
Bahia
Hospital Prof. Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Goiás
Hospital das Clinicas da Universidade Federal de Goiás (HC/UFG)
Minas Gerais:
Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (HC/UFTM)
Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia
Mato Grosso:
Hospital Universitário Júlio Müller (HUJM), vinculado à Fundação Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT)
Mato Grosso do Sul:
Núcleo de Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian (NHU), vinculado à Fundação Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (FUFMS)
Maranhão
Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HU/UFM)
Rio de Janeiro
Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia
Instituto Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG), vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Hospital Universitário Clementino Fraga Filho - HUCFF/UFRJ
Pará
Hospital Universitário João de Barros Barreto – UFPA
Paraná
Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR)
Paraíba
Hospital Universitário Alcides Carneiro, vinculado à Universidade Federal de Campina Grande - HUAC/UFCG
Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW)
Pernambuco
Hospital das Clínicas de Pernambuco, vinculado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Rio Grande do Sul
Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM)
Santa Catarina
Hospital Universitário Polydoro Ernani de São Thiago da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Sergipe
Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe (HU/UFS)
FONTE: Contas Abertas